sexta-feira, 17 de abril de 2015

Remate na Gaveta - E agora, Domingos?

Desengane-se quem pensa que a vida de treinador é fácil. Sem dúvida que a competência é extremamente importante para o seu sucesso mas a lista de todos os outros fatores, não menos importantes, que ditam a progressão na carreira de um treinador é tão extensa que podemos afirmar que estamos perante uma das profissões mais instáveis do Mundo!

Que o diga Domingos Paciência e a sua enigmática carreira.

Depois de passar pelos escalões mais jovens e pela equipa B do FC Porto, Domingos teve a sua primeira grande oportunidade como treinador principal na U. Leiria, na época de 2006/07. Apesar de estar a lutar por um lugar de acesso às competições europeias, Domingos deparou-se com diversos problemas do ponto de vista disciplinar. Segundo foi possível perceber na altura, o treinador português queria “mão pesada” para alguns jogadores do plantel, ao contrário da estrutura diretiva da U. Leiria, que entendia não ter condições para se desembaraçar dos mesmos jogadores. Domingos não conseguiu lidar com o caso e a tensão deu lugar a demissão no final de Março de 2007. Foi o ponto final na primeira experiência do técnico que, apesar das adversidades, conseguiu formar um grupo de trabalho que alcançou o sétimo lugar e o apuramento para a Taça Intertoto (e posteriormente para a Taça UEFA).


Domingos tinha superado as expetativas e começou a sua caminhada em direção ao Norte, tendo feito a sua primeira paragem em Coimbra, para treinar a Académica. Por ali passou duas temporadas, tendo conseguido alcançar o sétimo lugar na segunda temporada, a melhor classificação da Briosa das últimas décadas e o registo de uma vitória a cada três jogos, simplesmente brilhante para uma equipa que tradicionalmente vem sempre lutando para evitar a descida ao segundo escalão do futebol português. Era inegável a qualidade de Domingos, a capacidade de fazer jogar uma equipa, de explorar os seus pontos fortes, de maximizar as suas qualidades. Tinha a lição muito bem estudada.

Não foi, por isso, de estranhar, que no final dessa temporada o técnico português tenha feito as malas e continuado a sua viagem, desta feita parando em Braga. Uma equipa com outras aspirações, um desafio verdadeiramente aliciante. A equipa começava a crescer, sustentada na experiência e qualidade de Jesualdo Ferreira (tricampeão no FC Porto) e Jorge Jesus (acabado de contratar pelo SL Benfica) e António Salvador via em Domingos um sucessor à altura, depois das apostas não conseguidas com Carlos Carvalhal, Rogério Gonçalves, Jorge Costa e Manuel Machado.


Os resultados foram imediatos e, no mínimo, estrondosos! Disputou o campeonato até à última jornada com o SL Benfica de Jorge Jesus (que acabaria por ser campeão), tendo terminado no soberbo segundo lugar, posição nunca alcançada pela equipa minhota! Mais: apurou a equipa para a Champions League, feito único dos arsenalistas! Domingos construiu uma verdadeira equipa como mandam as regras, de trás para a frente, prova disso o estatuto de melhor defesa do campeonato, com apenas 20 golos sofridos em 30 jogos! Excelente média, tendo em consideração que foi das melhores equipas do ponto de vista disciplinar (apenas 2 cartões vermelhos em toda a temporada), números que suportam o rótulo de uma equipa agressiva mas que não recorria sistematicamente à falta aquando da recuperação da bola. Transformou a “Pedreira” numa autêntica fortaleza, alcançando 14 vitórias e um empate nos 15 jogos disputados em casa, e viu a sua equipa perder para o campeonato em apenas 3 ocasiões (na Luz, no Dragão e em Guimarães)! Poucas palavras me ocorrem para descrever a justiça e o mérito dos 71 pontos alcançados nessa temporada (fruto das 22 vitórias e dos 5 empates, em 30 jogos), pontos que, noutras épocas, seriam mais do que suficientes para a equipa se sagrar campeã nacional. Por muito pouco que Domingos não o conseguiu…

Na temporada seguinte tivemos, sobretudo, um SC Braga a dar cartas fora de portas. A Champions exigia competência máxima de todo um plantel com pouca experiência nestas andanças, pelo que todo o trabalho e entrega eram poucos. Na fase de grupos, os minhotos alcançaram uns surpreendentes 9 pontos (espantando a Europa do futebol), deixando fugir o apuramento para os oitavos-de-final na derradeira jornada de um grupo composto por Arsenal, Shakthar Donetsk e Partizan de Belgrado. A vitória em casa sobre o Arsenal por 2:0 e o bis de Matheus terão sido o ponto alto desta campanha.

O 3º lugar do grupo deu acesso à Liga Europa, prova onde o SC Braga de Domingos foi quase perfeito. Quase, porque apesar de ter feito uma caminhada histórica eliminando Lech Poznan, Liverpool (!!!), Dínamo Kiev e SL Benfica, não resistiu ao golo solitário do colombiano Falcao na final “portuguesa” de Dublin’11. 


Domingos foi o obreiro de todo o percurso minhoto ao longo dessas duas temporadas, marcado por recordes atrás de recordes, pela capacidade de tornar esta equipa numa referência nacional e internacional. Foi unânime o reconhecimento do mérito do técnico português na ascensão e afirmação do SC Braga como o 4º grande do nosso futebol! Domingos vivia uma fase de sonho e era perfeitamente natural que os grandes clubes o quisessem! Aquilo que tinha revelado em apenas 5 anos de carreira era entusiasmante, ao nível do que Mourinho tinha “dado” ao futebol português, para além de todo o seu percurso como jogador profissional, marcado pelo sucesso.

Foi então que Domingos “perdeu o norte” quando, contra todas as expectativas viajou para o sul do país, para orientar o Sporting CP (quando era dado como futuro treinador do FC Porto). A sua passagem pelo clube de Alvalade foi muito curta. O clube ocupava o 4º lugar em Fevereiro’12 quando o técnico natural de Leça da Palmeira foi demitido: uma desilusão, principalmente para todos os adeptos sportinguistas, que desesperavam por estabilidade no “reinado” de Godinho Lopes.


Talvez manchado ou rotulado por esta experiência não tão bem sucedida, Domingos teve quase um ano sem orientar nenhum clube e acabou por aceitar o convite do Deportivo da Corunha, que ocupava o último lugar da tabela classificativa no fecho do ano civil de 2012. Uma vitória, um empate e quatro derrotas depois, Domingos apresentou a demissão. Foram apenas 43 dias à frente do clube espanhol! Outras experiências falhadas se seguiram, mais concretamente no Kayserispor (Turquia), de Janeiro’14 até ao final dessa temporada e, mais recentemente, ao comando do Vitória de Setúbal, cargo que já abandonou em Janeiro’15 (depois de iniciar a época na equipa sadina), na sequência dos maus resultados.

Passados que estão quase 9 anos depois da estreia de Domingos como treinador profissional de futebol, podemos facilmente apontar para um crescimento nos seus primeiros 5 anos e uma vertiginosa queda nas 4 temporadas seguintes. Foram 4 épocas em que não conseguiu começar e acabar no mesmo clube, à semelhança do que já tinha acontecido no U. Leiria.

Por incrível que pareça, depois de tudo o que fez em Braga, Domingos é um treinador com pouco mercado. A que se deve este “fechar de portas”? À fraca prestação na sua verdadeira prova de fogo, quando treinou o Sporting CP? Ao seu feitio alegadamente conflituoso, patente na temporada de Leiria e fator que terá levado Pinto da Costa a abdicar deste “filho da casa” quando o técnico estava no auge da sua carreira?

As dúvidas são mais do que muitas, as respostas procuram-se…


Uma coisa é certa: com Domingos, eu vi a melhor Académica de sempre e vi o melhor SC Braga de sempre! Vi um Sporting CP melhor do que estava nas temporadas anteriores (após a saída de Paulo Bento), mas que estava “louco” por resultados imediatos, fruto da grande instabilidade diretiva, algo que o técnico não conseguiu nos primeiros meses à frente da equipa. Isso ninguém apagará. As qualidades estão lá, apesar do técnico não ter escolhido melhor os seus projetos desde a saída de Alvalade, passagem que tem manchado, injustamente, a sua imagem e reputação como treinador. Talvez precise de mais paciência e assertividade na hora de escolher o clube ideal, o clube que o possa alavancar novamente, que o faça voltar ao patamar que nos habituou em Coimbra e em Braga.

Acredito que ainda vamos ver um grande Domingos nos próximos anos, quiçá já na época de 2015/16! Eu estarei cá para recordar todos esses momentos porque…


Uma vez amado, para sempre recordado!

A memória do João


2 comentários :

  1. 7 lugar melhor qualificação da briosa é para rir, 2 nos finais de sessenta e varios 4 lugares é melhor pesquisar antes de escrever.

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    1. Foi, de facto, um lapso, a ideia seria reconhecer que essa foi uma das melhores classificações da Briosa das últimas décadas. Muito obrigado pela correção, "Anónimo" ;)
      A exigência e o contributo de todos os leitores são essenciais ao nosso crescimento. Obrigado!

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