Esta
semana recordamos um dos jogadores sul-americanos que mais anos passou pelo
nosso campeonato e que deixou uma imagem imaculada. Foram 13 anos a servir o
futebol português, neste caso SL Benfica, o Estoril Praia e o Boavista FC, transparecendo
profissionalismo, dedicação, entrega, raça e muita paixão! Hoje é dia de
relembrar, com saudade, o boliviano Erwin Sánchez.
Erwin Sánchez nasceu em 1969 em Santa Cruz de la Sierra, segunda maior cidade da Bolívia, localizada no centro do país. Deu os primeiros passos numa academia local, o Tahuichi Academy, até atingir a idade sénior. Aos 18 anos assinou pelo Club Destroyers, clube da terra mas que já militava no principal escalão do futebol boliviano. No ano e meio que defendeu as cores do Destroyers, Sánchez fez 67 jogos e marcou 23 golos, algo excecional para um jovem médio! Foi então que se mudou para La Paz. Na capital boliviana, a mais de 3.600 metros de altitude, representou o Bolívar por mais época e meia e voltou a dar nas vistas. Apesar de estarmos em 1990, quando a circulação de jogadores não era o reboliço de hoje, Sánchez viu estamparem-lhe o passaporte com um carimbo um pouco invulgar: Portugal!
Foi
o SL Benfica quem lhe abriu as portas da Europa. Vice-campeão europeu na
temporada anterior, o SL Benfica de Eriksson e de Toni surpreendia pela aposta
no boliviano. O plantel era maioritariamente composto por portugueses, com exceção
do mini clã sueco (Jonas Thern, Schwarz e Magnusson), do angolano Vata e dos
brasileiros Ricardo Gomes, William, Valdo, Lima e Isaías. Apesar de ter sido
campeão na sua época de estreia, Sánchez não foi feliz na Luz, atuando apenas
em 15 partidas e marcando um golo. Na temporada seguinte voltou a não ser
aposta no clube encarnado e acabou emprestado ao Estoril Praia, clube por quem
atuou por 28 vezes e onde recuperou a sua veia goleadora: 8 golos.
Dispensado
em 1992, Erwin Sánchez rumou ao Porto e assinou pelo Boavista FC. Manuel José
era o treinador da equipa axadrezada e viu no boliviano a peça-chave para fazer
a ligação entre o meio-campo e o ataque. E Sánchez encaixou que nem uma luva no
estilo de jogo do clube do Bessa. Dono de uma técnica assinalável, o médio
boliviano tinha como principais armas a precisão do seu passe (principalmente o
longo) e a potência e colocação do seu remate.
Nos
5 anos em que defendeu a camisola do Boavista FC (neste período de 92-97), a eficácia
de Sánchez não se traduziu apenas em números, mas estes não nos deixam mentir:
105 jogos e 25 golos! Durante este período, juntamente com muitos outros,
certamente Sánchez se recordará particularmente de dois momentos:
1. A participação
da Bolívia no Campeonato do Mundo de 94, nos USA. Era a terceira vez que a “La
Verde” participava numa fase final (depois de ter sido convidada nos longínquos
anos de 1930 e 1950), mas nunca tinha conseguido a proeza de marcar um golo.
Pois bem, quem mais haveria de ser? O “Platini” boliviano, como é conhecido,
conseguiu esse feito único, ao bater Zubizarreta no jogo que terminou com a vitória
da seleção espanhola por 3:1. Sánchez foi internacional por 57 vezes e balançou
as redes contrárias em 15 ocasiões, mas nenhuma dessas vezes foi tão especial e
histórica como esta, uma vez que acabaria por se tornar no único tento
boliviano em campeonatos do mundo:
2. A
nível de clubes, a última destas épocas ao serviço dos axadrezados terá sido a
mais marcante para o boliviano. Conquistou o segundo troféu da sua carreira,
após a vitória por 3:2 na final do Jamor, frente ao SL Benfica, e com 2 golos da
sua autoria e uma espetacular exibição!
Porventura,
este jogo e o conhecimento profundo de Manuel José (técnico do SL Benfica) das
qualidades do boliviano terão proporcionado e apressado o seu regresso aos
encarnados! Com 27 anos, esta seria a verdadeira oportunidade de Erwin Sánchez
provar o seu valor de águia ao peito. No entanto, o SL Benfica vivia um dos
piores momentos da sua história, sob o comando de Manuel Damásio e João Vale e
Azevedo, num clima de constante instabilidade. Todos os anos a lista de
entradas e saídas de jogadores era extensa. Inexplicavelmente, depois de
cumprida a primeira temporada, na qual Sánchez participou em 26 jogos e foi o
terceiro melhor marcador da equipa, com 6 golos, perdeu a confiança da
estrutura benfiquista e acabou “encostado”. Na temporada seguinte (98/99) foi
emprestado ao Boavista FC e quando foi relegado para a equipa B do SL Benfica
no início de 99/00 percebeu que não tinha mais condições para continuar.
Apesar
de todo o seu profissionalismo, mesmo atuando no terceiro escalão do futebol
português, o próprio admitiu que pensou em emigrar, em tentar outros
campeonatos onde tinha mercado, nomeadamente no espanhol e inglês, mas o eterno
interesse do Boavista FC e o desejo da sua família em continuar a viver em
Portugal foram mais fortes: Sánchez, numa espécie de regresso ao passado,
voltou a deixar Lisboa e a seguir em direção ao Porto em busca de estabilidade,
de um clube que confiasse nas suas qualidades!
E
Sánchez regressou no período certo. Envergando a mítica camisola 37, o
boliviano foi a tempo de fazer parte do Boavistão de Jaime Pacheco, que
conquistou com todo o mérito o título de campeão nacional na temporada de
2000/01! Era o terceiro e o último título no historial de Sánchez, todos no
futebol português, o segundo pelo Boavista FC, porventura o mais importante e
emblemático! Erwin era um esteio nesta equipa, por ele passava todo o jogo do
clube do Bessa, ele era o pensador, o estratega, o exímio cobrador das bolas
paradas da equipa, o também goleador (9 golos nessa época), o complemento de
Jaime Pacheco no terreno de jogo, muito graças aos 10 anos de casa que levava e
ao seu perfil, como homem. A sua preponderância era pura demais evidente:
Cumpridas
mais duas temporadas no Boavista FC (12 no global) e depois de algumas lesões
graves, Sánchez decidiu regressar às origens, ao futebol boliviano. Alinhou
pelo Blooming e pelo Oriente Petrolero e foi neste último clube que acabou por
fazer o seu último jogo, em 2005 (com 36 anos). Surpreendentemente, Erwin
Sánchez agrediu o árbitro da partida (frente ao Blooming) e acabou suspenso por
18 meses, proporcionando o adeus ao futebol como jogador.
Já
como treinador, voltou a Portugal na temporada de 2003/04 para treinar o
Boavista FC e em 2006 foi nomeado selecionador boliviano, ambas as
experiências sem grandes resultados. Atualmente, é treinador do Blooming, clube
boliviano que representou enquanto jogador.
Este
foi um dos jogadores que marcou a minha juventude. Jamais esquecerei o pontapé
canhão do “Platini” da Bolívia, daqueles passes longos a desmarcar os avançados
axadrezados, da sua preponderância nos títulos pelo clube do Bessa. Foi um
vencedor! Obrigado, Sánchez!
Uma
vez amado, para sempre recordado!
A
memória do João
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