terça-feira, 3 de março de 2015

Remate na Gaveta - Bella vitória


Esta semana recuperamos um jogo da mais prestigiada competição de clubes do mundo, a Champions League! Mais especificamente, recordamos um dos melhores resultados alcançados pelo FC Porto fora de portas.

Palco: San Siro(Milão, Itália)
Competição: Champions League 1996/97, Fase de Grupos, Grupo D, 1ª Jornada (11.09.1996)
Jogo: AC Milan 2:3 FC Porto

Efetivamente, o desfecho dos encontros entre equipas portuguesas e italianas não nos é favorável. O estilo de jogo mais defensivo, sólido e pragmático dos italianos tem sido extremamente eficaz nos confrontos com as equipas portuguesas, menos tolerantes, menos concentradas e menos confiantes nas suas reais capacidades. Felizmente, também tivemos casos de sucesso, exemplo disso mesmo este fantástico jogo e resultado alcançado pelos azuis-e-brancos.

O AC Milan era “apenas” o campeão italiano e nas duas últimas participações na Liga dos Campeões tinha chegado à final, perdendo uma frente ao Ajax por 1:0 em 1993 e vencido outra, no 4:0 frente ao Barcelona na final de 1994. O seu plantel estava recheado de estrelas, como Rossi, Panucci, Desailly, Maldini, Costacurta, Albertini, Boban, Davids, Ambrosini ou Marco Simone. Mas no meio de todas estas, cintilavam bem lá no alto outras duas: Roberto Baggio e George Weah!


O italiano era um dos melhores jogadores da atualidade, por alguma razão tinha recebido a Bola de Ouro FIFA em 1993 e tinha ficado em 3º lugar no ano seguinte (ao serviço da Juventus). O miúdo do “rabinho de cavalo” era constantemente apanhado em campo em excesso de velocidade e com técnica a mais no sangue. Com ele em campo, o êxtase era uma constante. Já o liberiano estava no topo da sua carreira, era para muitos o melhor ponta-de-lança da altura, tendo conquistado a Bola de Ouro em 1995 (com Maldini em segundo lugar) e o segundo lugar em 1996, sem qualquer contestação! O uruguaio Óscar Tabárez tinha à sua disposição um dos plantéis mais apetecíveis da atualidade, disso ninguém tinha dúvidas.

No entanto, do outro lado, estava um FC Porto bicampeão sob as mãos de Bobby Robson, que acabou por sair para Barcelona. Pinto da Costa tinha escolhido António Oliveira, velha glória do clube, ex-selecionador de Portugal no Euro96, e estabelecido como grande objetivo a conquista do tricampeonato, que fugia aos dragões desde o início dos anos 30. No entanto, o FC Porto ia espalhando a sua qualidade nos relvados europeus e não queria manchar essa reputação. Na grande equipa do FC Porto jogavam João Pinto, Rui Jorge, Aloíso, Jorge Costa, Rui Barros, Paulinho Santos, Sérgio Conceição, Zahovic, Domingos, Drulovic, Edmilson, Artur e… Mário Jardel, acabadinho de chegar ao clube, vindo do Gémio! A mística do clube estava impregnada na maioria dos jogadores, já com muitos anos de casa e isso fazia a diferença!

Esta era a primeira jornada de um grupo completado pelos noruegueses do Rosenborg e pelos suecos do IFK Gotenburgo. Para o jogo os treinadores fizeram alinhar os seguintes onzes:
AC Milan: Rossi, Panucci, Reiziger, Desailly, Maldini, Galli, Albertini, Boban, Baggio, Simone e Weah.
FC Porto: Wozniak, Jorge Costa, Fernando Mendes, Aloísio, Lula, Paulinho Santos, Sérgio Conceição, Barroso, Zahovic, Artur e Edmilson.


Se do lado do AC Milan não haviam grandes surpresas, do lado do FC Porto todos os prognósticos para o onze inicial saíram completamente ao lado. António Oliveira entendeu que a equipa precisa de maior solidez na defesa e meio-campo e estreou 3 elementos com a camisola azul-e-branca! Lula e Fernando Mendes (ambos ex-Belenenses) e Zahovic (ex-Vitória de Guimarães) tinham aqui uma bela oportunidade de se mostrarem! Os dragões entraram em campo com um esquema de três centrais (Jorge Costa, Lula e Aloísio), dois alas com grande profundidade ofensiva (Sérgio Conceição e Fernando Mendes), dois médios de contenção (Paulinho Santos e Barroso) e, depois, três elementos capazes de atazanar a defensiva milanesa (Zahovic no apoio a Artur e Edmilson).

Aos 14 minutos o primeiro momento da partida. Paulinho Santos falhou o passe no momento da construção de jogo e a bola sobrou para quem não devia, Roberto Baggio. O génio italiano combinou com Weah, arrancou em direção à área e assistiu Marco Simone que, com um trabalho notável, livrou-se da tripla de centrais portista e abriu o ativo! Estava desmontado o castelo que Oliveira queria construir durante grande parte do jogo. La squadra rossonera controlava e dominava a partida e tentava o segundo golo, o da tranquilidade. O FC Porto ia aplicando o estilo de jogo italiano, com muita cautela no processo defensivo e sempre à espreita de uma posse de bola para avançar com velocidade. Teve alguns lances que poderiam ter dado golo mas era pouco para o caudal ofensivo que os milaneses apresentavam. O 1:0 manteve-se até ao intervalo e, cinco minutos antes, Reiziger (lesionado) tinha dado o lugar a Mauro Tassotti que, com 36 anos, viria a ser uma das figuras da partida.

O balneário fez bem aos portistas. Na segunda-parte veríamos um grande espetáculo! Aos 52 minutos, após jogada pela esquerda iniciada por Fernando Mendes, Zahovic vê Artur livre da marcação de Tassotti dentro da área e assiste o ex-Boavista. O brasileiro, com uma enorme classe, fintou um dos melhores defesas do mundo (Maldini) e atirou a contar: 1:1! Surpresa em Milão!


António Oliveira, sem medo e a ver o seu FC Porto com disponibilidade e ambição para mais do que o empate, lançou Mário Jardel aos 62 minutos, em detrimento de Barroso (recuando Zahovic). O FC Porto estava melhor e a dupla Jardel-Artur ameaçava a defensiva contrária, sempre com Tassotti como o elo mais fraco da defesa italiana.

No entanto, contra a corrente do jogo, Weah (quem mais?) fugiu aos centrais portistas e emendou à boca da baliza um cruzamento venenoso de Marco Simone! O AC Milan ganhava novamente vantagem no marcador aos 69 minutos! Weah saiu lesionado do lance do golo e teve mesmo de ser substituído, um rude golpe para a equipa rossonera. Este terá sido um dos últimos lances de perigo do AC Milan e o momento de viragem no jogo, que apontou todos os holofotes para a péssima exibição de Tassotti. O italiano dava muito espaço aos avançados portistas, falhava passes, marcações, perdia nos duelos, estava em dia não e isso motivava o FC Porto! Oliveira arriscou tudo, desfazendo a tripla de centrais e fazendo entrar Drulovic para o lugar de Aloísio, aos 73 minutos.


Três minutos mais tarde, nova jogada pela esquerda, Zahovic cruza para a área e Super Mário fez o que tão bem ele sabia fazer, o golo de cabeça! Remate exemplar do brasileiro, do cabeça de ouro, deixando Rossi pregado ao relvado sem qualquer hipótese de defesa! O FC Porto acreditava!

Mas a derrocada final do AC Milan ainda estava por acontecer. Passe para as costas de Tassotti, Artur ganhou na raça ao italiano e tentou o cruzamento. A bola sobrou novamente para Tassotti que “aliviou” para a entrada da área e para os pés de Zahovic. O esloveno, mais uma vez no sítio certo e sempre de cabeça levantada, descobriu Jardel na área. O brasileiro livrou-se de Maldini e sentenciou a partida aos 83 minutos! 3:2 para os bicampeões nacionais, era a reviravolta no marcador, o corolário de uma bela exibição, sobretudo na segunda-parte, marcada sobretudo pela grande qualidade de Zahovic e dos avançados brasileiros portistas, que não desperdiçaram os buracos abertos pela defensiva italiana. Vale a pena recordar:


Esta foi uma das melhores fases de grupos de sempre do FC Porto na Champions League, cedendo pontos apenas no empate a 1 na receção ao AC Milan (surpreendente os italianos ficariam no terceiro lugar, através do Rosenborg). No entanto, viria a cair nos quartos-de-final aos pés do Manchester United.

Nada apagará este jogão em Milão, esta saborosa e tão rara vitória portuguesa em solo italiano. Estará sempre na nossa memória. Obrigado FC Porto!

Uma vez amado, para sempre recordado!


A memória do João


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