quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Remate na Gaveta - Argentina Olímpica


Esta semana no “Remate na Gaveta” vamos recordar uma das vitórias mais claras, convincentes e consensuais de uma seleção nacional nos últimos anos: a vitória da seleção argentina nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004!



Naturalmente, preferia estar hoje a elogiar o brilhante trajeto da seleção nacional portuguesa neste mesmo torneio, o que não aconteceu, apesar de termos apresentado uma equipa com grande potencial. Na equipa portuguesa estavam jogadores como Bosingwa, Ricardo Costa, Bruno Alves, Raúl Meireles, Hugo Viana, Danny, Hugo Almeida e… Cristiano Ronaldo! Mas, surpreendentemente, acabámos por ficar no último lugar num grupo composto por Iraque, Costa Rica e Marrocos. Definitivamente, Grécia e 2004 não eram sinónimos de títulos para Portugal. Mas adiante!

A Argentina partilhava o grupo com Austrália, Tunísia e Sérvia e Montenegro (que contava nas suas fileiras com os conhecidos Milan Stepanov e Simon Vukcevic, 3 anos mais tarde “reforços” de FC Porto e Sporting CP, respetivamente, e ainda Andrija Delibasic, avançado contratado pelo SL Benfica nesse mesmo ano). Claramente uma Argentina favorita e uma luta a três pelo segundo lugar do grupo, com ligeiro ascendente para a formação europeia.

Marcelo Bielsa era o treinador da albiceleste, estava nos quadros da seleção argentina há 6 anos e procurava o primeiro título da sua carreira ao nível das seleções, depois dos êxitos no campeonato argentino no início da década de 90 ao serviço do Newell’s Old Boys (onde jogava, curiosamente, o atual selecionador argentino Tata Martino).


El Loco Bielsa, como era conhecido, apostava num sistema de três centrais (imagem de marca da Argentina nos últimos anos), dando total liberdade aos dois elementos da frente de ataque, que funcionavam como verdadeiros vagabundos no meio-campo ofensivo! O onze inicial mais usado por Bielsa perfilava German Lux na baliza, tripla de centrais formada por Coloccini, Gabriel Heinze e Ayala, as alas estavam entregues a Mauro Rosales (direita) e Kily González (esquerda), no centro um trio composto por Javier Mascherano, Lucho González (um ano mais tarde assinou pelo FC Porto) e Andrés D’Alessandro e na frente, César Delgado e Carlos Tévez! Um onze de inegável qualidade, que contava ainda com o guarda-redes Willy Caballero (hoje no Man City), Nicolás Burdisso e os “futuros portugueses” Javier Saviola e Mariano González. De recordar que os Jogos Olímpicos são, essencialmente, um torneio mundial de sub-23, podendo cada seleção convocar um máximo de 3 jogadores com idade superior aos 23 anos. Bielsa apostou claramente na segurança defensiva, convocando Ayala (31 anos, jogador do Valencia CF) e Heinze (26 anos, jogador do Man Utd) e chamando ainda Kily González (30 anos, jogador do FC Inter) para dar profundidade à ala esquerda.

Os resultados foram sintomáticos: na fase de grupos a Argentina “despachou” a promissora Sérvia e Montenegro por uns claros 6:0, a Tunísia por 2:0 e a Austrália por 1:0! Foram 3 jogos, 3 vitórias, um goal-average de 9:0 e um massacre autêntico dentro do campo. A turma argentina tinha aprendido muito bem a lição do professor Bielsa, jogava de olhos fechados, não comprometia nos testes que tinha pela frente, tudo o que faziam dentro de campo era pura poesia! A dinâmica que a equipa apresentava, a constante mobilidade dos seus intervenientes saltava à vista de todos, era inegável a qualidade do futebol argentino, a raça, entrega, disponibilidade e solidariedade eram a razão de tamanho domínio dentro das quatro linhas!


A passagem aos quartos-de-final era inquestionável! Pela frente a seleção da Costa Rica, carrasco de Portugal, depois de nos terem vencido por 4:2 na derradeira jornada da fase de grupos, jogo marcado pelas ausências de Bruno Alves, Boa Morte e Cristiano Ronaldo (todos suspensos) e decidido pela expulsão do defesa-central João Paulo aos 45 minutos!

Pois bem, os argentinos "ficaram-se" pelos 4:0! Carlos Tévez espalhou toda a sua classe no relvado grego e assinou um hat-trick, depois de aberto o ativo por César Delgado!

Para as meias-finais perspetivava-se um jogo escaldante entre argentinos e italianos. Do outro lado, a seleção de Claudio Gentile apresentava Pelizzoli, Bonera, Matteo Ferrari, Palombo, Bovo, De Rossi, Pirlo, Gilardino… a valorização do hectare de terreno onde se disputou este jogo certamente que disparou no momento, tamanha a qualidade de ambas as equipas, dos diamantes que vestiram as suas camisolas em tons de azul! Um jogaço em perspetiva, que se previa extremamente equilibrado! Até que a seleção argentina decidiu continuar com o festival de verão… 3:0! Tévez (golaço), Lucho e Mariano González fizeram os golos de uma vitória incontestável da melhor equipa em campo, mais uma! Já não haviam palavras para descrever a qualidade da albiceleste!


Depois de tudo o que tínhamos visto, o jogo da final frente ao Paraguai (mais uma seleção de má memória para Portugal) parecia ser apenas uma cerimónia de encerramento e de entrega da medalha de ouro ao conjunto argentino! O Paraguai queria evitar essa “anunciada” festa argentina, mas o golo de Tévez aos 18 minutos (o oitavo da competição, tornando-se no melhor marcador da prova) e a expulsão de Emilio Martinez aos 66 minutos sentenciaram a partida!

A Argentina era campeã olímpica em 2004! A equipa de Bielsa ganhou todas as 6 partidas que disputou, marcou 17 golos e não sofreu qualquer um! Inquestionável, inegável, consensual, convincente: a Argentina foi a melhor equipa do torneio e venceu com toda a justiça!


O gozo que deu assistir à segurança e experiência do trio de centrais, à consistência de Mascherano, Lucho e D’Alessandro no meio-campo, às incursões ofensivas de Mauro Rosales e Kily González pelas faixas e à constante irreverência e rebeldia de César Delgado e Carlitos Tévez, soltos na frente! A facilidade com que jogavam sem bola, abrindo espaços em qualquer brecha de terreno era incrível, facilitando sempre a vida ao portador da bola! Não eram precisas muitas jogadas individuais para fazer a diferença! Todos os jogadores tinham ficha para entrar no carrossel da equipa, onde se divertiam e deliciavam qualquer adepto do bom futebol. A Argentina fez desta competição uma festa de Agosto, uma festa olímpica e, por isso, serão sempre recordados!

Argentina Olímpica, uma vez amada, para sempre recordada!  

A memória do João

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