Francisco
Teixeira, estudante e adepto do desporto, apresenta-nos o futebol de uma forma
na qual normalmente não discutimos, como “algo natural” e cultural, e confessa que incomoda-o ”a falta de
reconhecimento aos atletas de outras modalidades”. O futebol é visto por
Francisco como o “desporto rei” graças à sua grande mediatização mas, ainda
assim, não deixa de apresentar a sua opinião sobre os atuais melhores jogadores
do mundo, Messi e Cristiano Ronaldo.
(Parte II) - ver Parte I
Z: Disseste que o desporto traz muito mais coisas boas que ruins, mas o
que despoleta as coisas ruins não será a forma como o desporto é utilizado e
não o desporto em si?
F: É bem visto,
formulei mal a frase.
Z: Então acredita que é a sociedade, já “formatada”, pela sua cultura e
pelos media, que acabam por utilizar o desporto de forma negativa?
F: Sim. Não
posso dizer mais do que concordar em absoluto. Até porque os males do desporto
em si se resumem às lesões e, em alguns casos, à violência.
Z: Além de ser adepto do futebol, pratica-o regularmente?
F: Não mais, infelizmente.
Joguei futebol desde os 6 aos 18 no Vitória de Guimarães, mas uma lesão complicada
no joelho esquerdo tirou-me essa possibilidade. Tenho de ter muitos cuidados e
é mesmo imprudente praticar futebol ou outro desporto que envolva baixar o
centro de gravidade, saltos ou choque, mais do que uma vez por semana. A
natação é o único desporto recomendado para mim.
Z: Alguma vez pensou, quando ainda jogava, em fazer isto
profissionalmente?
F: Sim,
ironicamente meses antes de abandonar, começava a pensar isso de forma mais
séria, pois aproximava-me de um nível mais elevado. Não era um fora de série,
de todo. Era um jogador muito posicional que
decidia rápido e procurava simplificar o jogo. Tinha algumas debilidades, como a
lentidão e a falta de agressividade, que não me
permitiriam chegar muito longe, por isso a expectativa mais alta seria chegar à
primeira liga portuguesa. Acreditei nessa possibilidade porque estava num clube
onde os jovens são aposta regular, porque já previa um recurso mais geral ao
mercado nacional e também o baixar significativo do nível do futebol português.
Era bastante simples mas
acreditava que tinha uma hipótese, no entanto, não é como se tivesse levado
anos a sonhar com isso. Não sinto hoje qualquer tipo de frustração. Há outras áreas
do meu interesse e o mundo do futebol não se esgota na função de futebolista.
Z: Acha que o futebol português, hoje, não está num alto nível?
F: Quando
falo no nível é em termos relativos. Acho que o nível não é alto, tendo em
conta as ligas mais poderosas. Quando falo no baixar de nível é tendo em conta
as últimas décadas, as políticas de contenção de custos na maioria dos casos
resultam na redução da qualidade. Embora tenhamos hoje 2 equipas ao nível dos
melhores campeonatos, FC Porto e Benfica, a verdade é que há uma disparidade
grande entre esses clubes e os outros integrantes do campeonato. Se fosse
realizado o, tantas vezes clamado, campeonato Ibérico, imagino que Portugal
contasse com não mais do que 4 equipas.
Z: Qual a solução que propunha para este problema?
F: Acho que
investimento na formação, categorias infantil e juvenil, já há em muitos casos.
O maior problema reside, ou tem residido, na integração do atleta no futebol
profissional. O espaço nos grandes clubes é reduzido e há poucos - bem mais do
que há 5 anos ainda assim, felizmente - treinadores corajosos para apostar em
miúdos. Assim, muitas vezes, os jovens talentos andam a “rodar” em divisões
inferiores que têm pouco para lhes ensinarem. Em Inglaterra vejo, a toda a hora,
estreias de rapazes de 17 ou 18 anos na Premier League. Em Portugal, para além
de Sporting, Vitória de Guimarães e Vitória de Setúbal, há um medo terrível em
olhar para as categorias base.
Mas, enfim,
acredito que a solução esteja na formação, embora não seja uma questão de
investimento.
Z: Acha que podemos dar crédito ao futebol pela grande adesão do
público? Na sua opinião, qual o motivo para que o futebol seja
"escolhido" como desporto rei?
F: São
perguntas mais difíceis de responder, mas o crescimento do futebol em países
com menos tradição, como alguns no leste da Europa, acaba por confirmar que
sim, que há mérito. Acho que as estruturas no futebol, criadas muito cedo,
foram determinantes e autênticos propulsores.
A FIFA remonta ao início do
século XX e a UEFA aos anos 50, os campeonatos do mundo começaram a realizar-se
logo desde os anos 30.
Outra possível razão, que é mais
uma suposição, seria o facto de o futebol ter sido popularizado na Europa
Ocidental em primeira instância. Era na Europa Ocidental
onde existiam os grandes países colonizadores, em África e Oceânia, ou ex-colonizadores,
América. Esses países tinham uma grande capacidade de estabelecer relações
culturais com o resto do mundo. Como se espalharam outras formas culturais,
como a moda, a dança, a língua, a moeda, por exemplo, podem se ter reproduzido
as tradições no âmbito desportivo.
Z: Então, resumidamente, é mais a forma como o desporto é publicitado e
foi levado para o mundo que o leva a ter o reconhecimento que tem hoje?
F: Tenho pena de
não ter uma visão mais romântica do futebol, mas sim, concordo.
Z: Seguindo esse raciocínio, pode-se dizer que Cristiano Ronaldo e sua
publicidade é um grande motivo para que Portugal seja ainda mais adepto do
futebol e para que os outros países conheçam melhor o futebol português?
F: Com certeza.
Devemos desfrutar de termos um dos melhores do mundo e, quiçá, da história ao
serviço do nosso país. É algo que nos envaidece e o mais natural é que a sua
existência justifique um maior interesse pela Seleção e pelo futebol nacional.
Contudo, não é
só aqui que o temos como um ídolo e o facto de adeptos de outros países o
conhecerem e reconhecerem traz outra visibilidade ao nosso futebol. Sinto que
desde o surgimento de Figo, Simão, Ronaldo e Nani, olham para a escola
portuguesa de outra forma. As suas prestações abriram portas a outros
futebolistas e é engraçado que eles traçaram o perfil do jogador português lá
fora - velocidade, boa técnica e boa capacidade de drible. Repara que hoje
somos um país exportador de futebolistas. Jogadores que já passaram em clubes
de Portugal estão hoje em equipas de elite.
Z: Acredita que Cristiano Ronaldo é o melhor jogador do mundo?
F: Não, acho o Messi bem superior. Muitas
pessoas acham que por Ronaldo ser alto, forte, cabecear bem e ter um bom pé
esquerdo o torna completo, mas o Messi finta, passa, assiste, constrói, marca e
conduz. Isso é ser completo! Um verdadeiro multifunções dentro do campo.
Z: Muito obrigada, Francisco.
Ana Zayara Michelli
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