sábado, 6 de dezembro de 2014

Remate da Z - Francisco Teixeira (Parte II)

Francisco Teixeira, estudante e adepto do desporto, apresenta-nos o futebol de uma forma na qual normalmente não discutimos, como “algo natural” e cultural, e confessa que incomoda-o ”a falta de reconhecimento aos atletas de outras modalidades”. O futebol é visto por Francisco como o “desporto rei” graças à sua grande mediatização mas, ainda assim, não deixa de apresentar a sua opinião sobre os atuais melhores jogadores do mundo, Messi e Cristiano Ronaldo.

(Parte II) - ver Parte I

Z: Disseste que o desporto traz muito mais coisas boas que ruins, mas o que despoleta as coisas ruins não será a forma como o desporto é utilizado e não o desporto em si?
F: É bem visto, formulei mal a frase.

Z: Então acredita que é a sociedade, já “formatada”, pela sua cultura e pelos media, que acabam por utilizar o desporto de forma negativa?
F: Sim. Não posso dizer mais do que concordar em absoluto. Até porque os males do desporto em si se resumem às lesões e, em alguns casos, à violência.

Z: Além de ser adepto do futebol, pratica-o regularmente?
F: Não mais, infelizmente. Joguei futebol desde os 6 aos 18 no Vitória de Guimarães, mas uma lesão complicada no joelho esquerdo tirou-me essa possibilidade. Tenho de ter muitos cuidados e é mesmo imprudente praticar futebol ou outro desporto que envolva baixar o centro de gravidade, saltos ou choque, mais do que uma vez por semana. A natação é o único desporto recomendado para mim.

Z: Alguma vez pensou, quando ainda jogava, em fazer isto profissionalmente?
F: Sim, ironicamente meses antes de abandonar, começava a pensar isso de forma mais séria, pois aproximava-me de um nível mais elevado. Não era um fora de série, de todo. Era um jogador muito posicional que decidia rápido e procurava simplificar o jogo. Tinha algumas debilidades, como a lentidão e a falta de agressividade, que não me permitiriam chegar muito longe, por isso a expectativa mais alta seria chegar à primeira liga portuguesa. Acreditei nessa possibilidade porque estava num clube onde os jovens são aposta regular, porque já previa um recurso mais geral ao mercado nacional e também o baixar significativo do nível do futebol português.
Era bastante simples mas acreditava que tinha uma hipótese, no entanto, não é como se tivesse levado anos a sonhar com isso. Não sinto hoje qualquer tipo de frustração. Há outras áreas do meu interesse e o mundo do futebol não se esgota na função de futebolista.

Z: Acha que o futebol português, hoje, não está num alto nível?
F: Quando falo no nível é em termos relativos. Acho que o nível não é alto, tendo em conta as ligas mais poderosas. Quando falo no baixar de nível é tendo em conta as últimas décadas, as políticas de contenção de custos na maioria dos casos resultam na redução da qualidade. Embora tenhamos hoje 2 equipas ao nível dos melhores campeonatos, FC Porto e Benfica, a verdade é que há uma disparidade grande entre esses clubes e os outros integrantes do campeonato. Se fosse realizado o, tantas vezes clamado, campeonato Ibérico, imagino que Portugal contasse com não mais do que 4 equipas.

Z: Qual a solução que propunha para este problema?
F: Acho que investimento na formação, categorias infantil e juvenil, já há em muitos casos. O maior problema reside, ou tem residido, na integração do atleta no futebol profissional. O espaço nos grandes clubes é reduzido e há poucos - bem mais do que há 5 anos ainda assim, felizmente - treinadores corajosos para apostar em miúdos. Assim, muitas vezes, os jovens talentos andam a “rodar” em divisões inferiores que têm pouco para lhes ensinarem. Em Inglaterra vejo, a toda a hora, estreias de rapazes de 17 ou 18 anos na Premier League. Em Portugal, para além de Sporting, Vitória de Guimarães e Vitória de Setúbal, há um medo terrível em olhar para as categorias base.


Mas, enfim, acredito que a solução esteja na formação, embora não seja uma questão de investimento.

Z: Acha que podemos dar crédito ao futebol pela grande adesão do público? Na sua opinião, qual o motivo para que o futebol seja "escolhido" como desporto rei?
F: São perguntas mais difíceis de responder, mas o crescimento do futebol em países com menos tradição, como alguns no leste da Europa, acaba por confirmar que sim, que há mérito. Acho que as estruturas no futebol, criadas muito cedo, foram determinantes e autênticos propulsores.
A FIFA remonta ao início do século XX e a UEFA aos anos 50, os campeonatos do mundo começaram a realizar-se logo desde os anos 30.

Outra possível razão, que é mais uma suposição, seria o facto de o futebol ter sido popularizado na Europa Ocidental em primeira instância. Era na Europa Ocidental onde existiam os grandes países colonizadores, em África e Oceânia, ou ex-colonizadores, América. Esses países tinham uma grande capacidade de estabelecer relações culturais com o resto do mundo. Como se espalharam outras formas culturais, como a moda, a dança, a língua, a moeda, por exemplo, podem se ter reproduzido as tradições no âmbito desportivo.

Z: Então, resumidamente, é mais a forma como o desporto é publicitado e foi levado para o mundo que o leva a ter o reconhecimento que tem hoje?
F: Tenho pena de não ter uma visão mais romântica do futebol, mas sim, concordo.

Z: Seguindo esse raciocínio, pode-se dizer que Cristiano Ronaldo e sua publicidade é um grande motivo para que Portugal seja ainda mais adepto do futebol e para que os outros países conheçam melhor o futebol português?
F: Com certeza. Devemos desfrutar de termos um dos melhores do mundo e, quiçá, da história ao serviço do nosso país. É algo que nos envaidece e o mais natural é que a sua existência justifique um maior interesse pela Seleção e pelo futebol nacional.


Contudo, não é só aqui que o temos como um ídolo e o facto de adeptos de outros países o conhecerem e reconhecerem traz outra visibilidade ao nosso futebol. Sinto que desde o surgimento de Figo, Simão, Ronaldo e Nani, olham para a escola portuguesa de outra forma. As suas prestações abriram portas a outros futebolistas e é engraçado que eles traçaram o perfil do jogador português lá fora - velocidade, boa técnica e boa capacidade de drible. Repara que hoje somos um país exportador de futebolistas. Jogadores que já passaram em clubes de Portugal estão hoje em equipas de elite.


Z: Acredita que Cristiano Ronaldo é o melhor jogador do mundo?
F: Não, acho o Messi bem superior. Muitas pessoas acham que por Ronaldo ser alto, forte, cabecear bem e ter um bom pé esquerdo o torna completo, mas o Messi finta, passa, assiste, constrói, marca e conduz. Isso é ser completo! Um verdadeiro multifunções dentro do campo.


Z: Muito obrigada, Francisco.

Ana Zayara Michelli


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